Clóvis Moura: um intelectual negro desvendando o Brasil
No final dos anos 1980, eu, um secundarista, vice presidente da União Municipal dos Estudantes Secundaristas (Umes) de São Paulo, conheci Clóvis Moura no extinto programa Matéria Prima, que era transmitido pela Rádio Cultura de São Paulo. O programa tinha Serginho Groisman como apresentador. Ele tinha boa fama junto ao movimento estudantil, pois havia estudado no Colégio Equipe, que tinha uma tradição democrática durante a ditadura militar. Não havia ainda o "mês de novembro" como centro das reflexões sobre a "consciência negra". Mas Clovis Moura, fiquei sabendo no dia, já era um intelectual importante para o movimento negro. Foi ele que me ensinou o que estava por trás do inocente adjetivo mulato, uma desumanização dos filhos de brancos com negros, muitas vezes fruto de violências e estupros. Mulato é a aproximação animalesca dada pelos portugueses, a partir do cruzamento entre um jumento e uma égua. Quando o filhote desse acasalamento é uma fêmea, ela é chamada de mula; quando nasce um macho, ele é popularmente chamado de burro Eu, ávido por entender o mundo, via no movimento estudantil a chance de conhecer as ideias sobre igualdade, luta de classes, democracia e cultura popular. Clóvis Moura, o bahiano sociólogo comunista, não era professor universitário. Negro, foi um autodidata que deixou obras que ajudam a compreedner as relações raciais no Brasil pelo materialismo histórico dialético. Clóvis Steiger de Assis Moura nasceu em 1925, em Amarante, no Piauí. Ingressou no PCB nos anos 1940, trabalhando como jornalista na Bahia e em São Paulo. Foi, na época, um dos poucos intelectuais que acompanhou o PC do B na ruptura com Luiz Carlos Prestes e a URSS em 1962. Nos anos 1970, destacou-se pela militância junto ao movimento negro brasileiro.
“Clóvis Moura é um cientista social brilhante e disciplinado que sempre atuou paralelamente à academia. Ainda que a academia brasileira tenha constantemente solicitado a sua presença em eventos, conferências, seminários e, especialmente, em exames de teses na qualidade de professor "notório saber", título que há anos lhe foi outorgado pela Universidade de São Paulo (USP), mesmo assim sua obra é pouco difundida nos estudos sociológicos sobre o negro brasileiro e as relações étnico raciais na universidade. Assim como outros intelectuais negros que são colocados à margem do pensamento brasileiro, vítimas do racismo estrutural que molda o pensamento brasileiro a partir de um modelo europeu, branco e elitizado. Neste dia de finados, minha homenagem ao grande e único Clóvis Moura.

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